Pelo
que me consta, isto não vai durar para sempre. E não vai resolver
prestar muita atenção no tic-tac do tempo (no tempo em que tic-tac não
era balinha pro bafo), que as tuas lamúrias não vão mudar nada.
Hoje venta forte pelos lados de cá. Há uma pilha de
coisas a fazer sobre a mesa – aquela que eu mesmo
fiz – e sobre o sofá de reserva – aquele que agora é um armário aberto.
Por que o cenário do Jonathan Ross parece saído de uma daquelas lojas
de móveis embaixo do Minhocão?
Quem nos trouxe até
aqui foi um germe invisível, empurrado por uma massa de energia que
tentamos entender. Contornou o nosso desequilíbrio, ordenou o lugar das
coisas, nos deu a inteligência e com ela instalamos o caos. Isto antes
do portal. Depois dele, a escrita nos explica de várias formas. Bem,
isto deve ser o resumo de um dos trabalhos a ser feito neste feriado.
Logo que eu me ponha de novo no lugar.
Nos
tempos em que gostava de cerveja - e de todas as garrafas ordenadas nas
prateleiras – eu já estaria na estrada agora. Estaria contando uma
história, estaria rastreando a origem das coisas e ajeitando os móveis
de uma casa fictícia onde mora Adélia, de um conto que perdi. Mas
remontei minha história, ainda que o melhor dela esteja naquela zona
cinzenta entre dois caminhos, quando soube os custos e benefícios de ser
livre.
Já perceberam as marcas de enchente nas paredes
das casas, nas regiões baixas, nos lados do Brás e Cruzeiro do Sul?
Aquilo marca um tempo – esse tic-tac quase imperceptível que vem do
relógio de camelô sobre a minha estante – e as pessoas que estavam por
ali podem não ser as mesmas. Mas numa mesa de bar, entre um
fogo-paulista (é, eu me lembro!) e cerveja, as suas narrativas poderiam
ser bem parecidas.
Há histórias num pen-drive que
acabei esquecendo no meio de cds, dvds e rascunhos de um dia qualquer,
de personagens por descrever. É engraçado isto, e quem escreve sabe. Nos
primeiros esboços de um personagem ele já ganha corpo e arranja um
espaço no seu dia a dia. E com o tempo, já consta dos registros
oficiais, com direito a RG, CPF e contagem de tempo de aposentadoria.
Alguns nascem velhos, com histórias que eles vão me contando aos poucos.
Vida e aleatoriedade é a mesma coisa, eles me dizem, com a sabedoria de
uma existência que ainda vou descobrir. E aqui está uma coisa que você
já ouviu e que os escritores sabem: depois que nasce um personagem, é
ele quem guia o escritor e não o contrário. É assustador, é
surpreendente, logo, é um vício.
Ao trabalho,
pois.
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