"... Meu
único filho bebia muito, era dado a boemia, um rapaz forte, de boa aparência,
puxou a mãe, a quem não chegou a conhecer. A um certo estágio tive que
arrastá-lo para clinicas de recuperação, mas nada durava muito. Conversávamos
muito, bebemos juntos muitas vezes, vi a maneira como ele se atirava em
discussões calorosas, de encontro ao seu fim e nunca consegui entendê-lo. Um
dia arrumou uma pescaria, alugou um barco, descemos para o litoral de
madrugada, da serra as nuvens formavam uma massa negra sobre o mar, o garoto
parecia calmo. Encostamos numa ilha, duas horas mar adentro, ele dispensou o
barco e pediu que o barqueiro viesse nos buscar no final da tarde. Não
descarregou isca, não tinha equipamento nenhum de pesca, apenas uma caixa
grande de isopor com gelo, uma caixa de cerveja e uma garrafa de uísque. O mar
estava bravo, o céu carregado de nuvens escuras, mas não chovia. Sentados em
uma pedra, era ainda cedo, um vento frio batendo em nossos cabelos, o menino
virou-se para mim e disse que tinha ido ali para morrer. Eu fiquei estarrecido,
não soube o que falar, seus olhos traziam um brilho estranho, disse que não
havia nada que eu pudesse fazer e que não me sentisse culpado por nada e que
ele, simplesmente, não queria mais viver. E que se eu tentasse impedi-lo, ele
iria se jogar na água e nadar até perder as forças, até que o mar o engolisse.
E assim foi que ele tomou a garrafa de uísque, um monte de cervejas e engoliu
alguns comprimidos brancos que trazia no bolso da bermuda. No final da tarde,
quando o céu ia se abrindo num cinza uniforme e a chuva era iminente, ele
deitou-se na pedra e morreu ali mesmo, sendo que antes me deu um abraço e disse
que eu era um cara legal. Voltamos com chuva, o barco pequeno sendo atirado
para todos os lados pelas ondas imensas, o barqueiro praguejando, e eu dizendo
a mim mesmo que se eu morresse naquele momento talvez ainda alcançasse meu
filho pelo caminho..."
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